Palavras porcas
- Autor: Jefferson Silva - E-mail: jefferson5684@gmail.com
- 22 de jan. de 2023
- 2 min de leitura
Certo dia me acusaram do crime de ser filósofo, filósofo é o caralho, eu sou um professor de filosofia constrangido pela existência. Existir é consequentemente estar constrangido. Sempre acreditei que o canalha é aquele que interpreta o constrangimento como fuga e o utiliza dentro de um movimento que acontece de dentro para fora para constranger o outro dentro do jogo da sedução. Eu não estou disposto a jogar o jogo. Desistir sempre será a segunda opção. No caminho que me trouxe até aqui, vejo os pássaros que nunca serão livres, pois não podem escolher não voar, é um condicionante, impositivo existencial e fisiológico que o limita a ser apenas o que o mundo o constrangeu a ser. Eu sou constrangido pela existência, mas a diferença entre eu e os pássaros é que posso mudar. Reagir é contestar o constrangimento. Hoje pela manhã, eu escutei algo muito comum dito por pessoas de cidades pequenas: “fulano morreu de tristeza”. Uma mulher dizendo acerca da morte de seu pai que era agricultor e estava impossibilitado por alguma doença de exercer o seu ofício, ao ver a chegada das chuvas e todos os amigos indo trabalhar, morreu de tristeza. A mais desgraçada objetificação do constrangimento, a verdadeira tristeza, definhar até a morte por não conseguir mais fazer aquilo que amou durante toda a sua vida. Afinal ,ele amou ou foi constrangido a amar? Não, não existem condicionantes no amor.. Mais adiante, indo ao supermercado escutei a conversa de duas mulheres, em que uma relatava a outra o aborto espontâneo que sofrera durante a gravidez de seu tão sonhado filho: “a enfermeira me mandou para casa, eu a questionei ‘com um feto morto dentro de mim?’, ela respondeu que não poderia fazer nada naquele momento.’, ela havia sido constrangida a carregar o seu maior sonho morto dentro de si. Tenho um quadro com uma foto de meu pai à direita da janela do meu quarto, ele morreu quando eu tinha quatro anos, agora ele habita as pouquíssimas recordações que a imagem de uma foto podem trazer de volta. Olho para a esquerda, avisto o retrato de meu pai quando sinto-me confuso e constrangido, ele não responde, mas sinto que de alguma maneira que sei a resposta. Imerso na filosofia da decadência, abro meus novos olhos para a existência e inverto o constrangimento em um movimento que agora se volta para o mundo que me oprime, enquanto me sento tristemente ao lado dela..

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