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Hitchcock em defesa do Humano? Crítica de “Rope” (1948)

  • joaop27
  • 10 de mai. de 2024
  • 3 min de leitura

Por: João Pedro De Castro

OBS: essa crítica contém SPOILERS




O último plano revela a verdade final do filme: vemos Phillip e Brendan no mesmo local onde cometeram o assassinato, dessa vez, porém, em papéis inversos. E a ironia é justamente a troca de lugares: o personagem de Stewart se torna o responsável por deter os criminosos, enquanto estes assumem os papéis dos “mortos”.


O filme inteiro funciona perfeitamente a partir de planos sequência delicados, que situam o espectador no ambiente fechado da narrativa: apenas uma festa, num apartamento, com poucos convidados. Partindo do pressuposto do crime perfeito, posto por Brendan, a câmera passeia maliciosamente pelas diversas cenas e situações contraditórias que constroem o filme: o túmulo do morto – que inclusive serve de mesa para o banquete da festa – a corda utilizada no assassinato, até mesmo as mãos e as expressões de nervosismo de Phillip. Esses detalhes são essenciais para a construção da tensão, pois vão sendo expostos de maneira a deixar pistas para a solução do crime. Nesse ponto a composição estilística do filme chega a ser, de certo modo, quase psicanalítica.


Brendan acredita ser um homem superior aos demais, acredita ter o direito de decidir sobre a vida dos que ele julga inferiores. Porém, como todo jovem aristocrata, ele precisa da validação daquele que, ao longo do filme, aparece como sua principal inspiração: o personagem de Stewart. A malícia das tensões construídas pelo plano sequência são, ironicamente, o desejo/ansiedade de, para Brendan, ser descoberto e receber os elogios por realizar um crime tão perfeito; a culpa e o medo de Stewart ser capturado; e para nós, que estamos no outro extremo da tela, de vermos os assassinos sendo pegos. 


Assim, a malícia da imagem é quase como um ato falho dos assassinos: um que anseia por validação e outro que teme ser descoberto. Essa “psicanálise” do estilo tem, contudo, um fundo social.


Para além disso também podemos falar a respeito das breves histórias contadas pelos personagens, que já indicam aos outros quem seriam os assassinos: é por isso que Phillip se desespera e se entrega ao lembrar da história do estrangulamento de galinhas, enquanto Brendan se diverte.


 Por sua vez, a validação buscada por Brendan funciona muito bem com toda a construção arquetípica da mise-en-scène: podemos ver os personagens do filme quase como “tipos ideais” lukácsianos. Ou seja, como personagens que carregam uma expressão universal e social (justamente a tipificação, aquilo que historicamente existe de mesmo em todo jovem aristocrata, por exemplo) em suas particularidades individuais - pois não deixam de serem personagens com contradições individuais e psicológicas dentro do mundo da obra.


O fundo de classe desvelado pela “imagem psicanalítica” do plano sequência encontra dois tipos ideais da burguesia do pós-guerra (momento de produção do filme): o intelectual irracional e sua juventude patrícia. O primeiro idealiza uma filosofia aristocrática na qual se acha no direito de se julgar superior aos demais. Já os seguintes, abraçam essa filosofia como os destinos de suas vidas. É por isso que, seguindo o fio de que os vários personagens se dispõem num ambiente de elite, conseguimos articular o ato falho de Brendan e do plano sequência dentro de uma esfera, até certo ponto, de classe. 


  Por fim, o assassinato que Brendan comete, quando revelado por Stewart, desvela uma certa ironia quanto a sua motivação: de maneira indireta Stewart motivou as ideias que levaram ao assassinato de David, enquanto ele descobriu o assassinato e se “redimiu” trazendo a polícia aos assassinos. É dessa forma que os papeis se invertem, e sobre a mesma janela do primeiro assassinato vemos – ou pelo menos supomos – a morte dos culpados. No fim, talvez possamos de dizer que se trata de um filme sobre Humanidade: sobre a defesa da fraternidade dos Homens frente a sua disrupção em sujeitos narcisistas e individualizados. 

Ótimo!

Escrito por: João Pedro De Castro

Instagram: @jpcastrode

Letterboxd: @JotaPe123

 
 
 

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